se eu fosse um pneu baloiço

Quando era pequena, e andava na escola, lembro-me de fazer um trabalho que consistia em dividir a folha em quatro e desenhar/ escrever como foi o fim-de-semana. Também me lembro de escrever composições. Havia sempre quem não gostasse deste género de trabalho de casa. Mas eu gostava. E as mais mais giras eram as que começavam com “Se eu fosse…”

Quando fiz o curso de escrita criativa da Rita da Nova no final do ano passado, um dos textos que ela propôs começava exatamente assim. “Se eu fosse…”. Ela deu-nos uma folha com um desenho e cada um de nós tinha de escrever como se fosse aquele objecto, sem revelar o que era, para os outros participantes adivinhassem através do nosso texto. Hoje decidi fazer um texto com essa mesma imagem.

Se eu fosse… um pneu a baloiçar:

Já me sinto um pouco velho. Hoje a minha função já não é aquela para a qual fui construído. Já andei muitos quilómetros, por essas estradas fora. Conheci muitos sítios. Vivi muitas aventuras. Descobri cidades, vilas, praias. Percorri caminhos fáceis e alguns bastante mais difíceis. É mesmo assim. Para chegarmos ao destino não escolhemos sempre o caminho mais curto e direto. Nem sempre os atalhos são os melhores caminhos, não é? Muitas vezes foram os caminhos mais compridos e mais duros que nos levam aos lugares mais bonitos. Tive de ter alguma paciência, isso é certo. Fui dando sinais de cansaço mas não desisti.

Cumpri o meu papel mas deixei de conseguir correr o mundo como antes. É a lei da vida, dizem. E então, ataram-me aqui a esta árvore, neste descampado. Alguém achou que eu podia ter uma segunda oportunidade. E a minha função foi reinventada. Ninguém sabe fazer só uma coisa. Somos capazes de fazer muitas coisas quem sabemos e podemos sempre aprender ainda mais uma. São as coisas novas que nos motivam a continuar e nos fazem evoluir.

Às vezes aparecem pessoas. Eu acho que eles são rufias, mas não me importo. Sentam-se ao meu colo e baloiçam. Os mais destemidos ficam mesmo de pé. Acho que os faço felizes porque se riem muito. Gosto de fazer parte das brincadeiras deles. Gosto desta vida que levo agora. Vivo dias animados quando eles estão cá e outros de descanso e calmaria. Quando eles não aparecem, sou empurrado pelas ondas do vento. Para a frente e para trás. Não é assim que andamos todos? Com pequenos balanços para trás e para a frente?