O trabalho é uma questão cultural?

Será o trabalho uma questão cultural? Estou de volta com um texto sobre o emprego e a importância da nossa realização profissional para o nosso bem estar pessoal.
Há uns dias vi um artigo que falava num novo termo (vira e mexe surgem estas coisas) acerca do mundo laboral. Parece que agora há quem não queira fazer mais do que as funções para as quais foi contratado. Chamaram a isto “despedimento silencioso”. Naturalmente, e é para isso que estas notícias vão parar às redes sociais, surgiu um bando de gente consumida pelo demo que se insurgiu contra estes malandros que não querem fazer trabalho a mais e muito menos horas extra.
Por falar nisso… no outro dia, a Sónia Morais Santos, desabafava no seu instagram que o marido ainda não tinha chegado a casa do trabalho e eram 20h da noite. De repente, viu-se inundada com mensagens de pessoas exatamente nesta posição. Que fazem horas a mais. E são até olhadas de lado se não o fizerem.
Horários de trabalho. Funções e tarefas.
E agora entro eu. Estas pessoas que olham de lado e criticam quem SAI A HORAS são com certeza as mesmas que acham os trabalhadores deviam fazer tudo o que lhes mandam sem argumentar, pestanejar ou mesmo…bom, respirar. Pessoas essas que também afirmam estar exaustas Mas que contribuem de forma descarada para que o sistema se mantenha desta maneira.
Fazer as NOSSAS tarefas DENTRO do horário é o que faz de nós bons profissionais. Não é fazermos o trabalho de duas ou três pessoas (para o qual às vezes nem fomos formados) Nem é sair uma hora depois todos os dias que a nossa produtividade e motivação aumentam. Pelo contrário. Muito, muito pelo contrário, mesmo! Espero que as novas gerações de trabalhadores venham mudar um pouco este paradigma que parece estar (ainda) instalado nas empresas de Portugal.
Se pensarmos bem, quando estamos “chateados” (para não dizer “revoltados”, “furiosos” ou “desiludidos”) com algum assunto de trabalho ou atitude da chefia, a primeira coisa que fazemos é: sair a horas. Dizemos mesmo bem alto para todos ouvirem “não, hoje, vou sair a horas, nem quero saber”. Já fizeram isto? Eu já. E o que é que isto significa? Nós mesmos, intrinsecamente, achamos que estamos a castigar a empresa se o fizermos. Que esta é a paga. O troco. Por não nos valorizarem. Ora bem, o sair a horas não é um castigo. Nem uma questão. É um não assunto. Porque é óbvio. Sair a horas devia ser todos os dias. Uma normalidade. Não uma consequência. Nem um castigo. Muito menos uma obrigatoriedade e uma questão cultural.
O emprego é uma questão cultural? Sim. Mas não devia.
Muitos dos relatos que chegaram no instagram à Sónia eram de pessoas que trabalham em países nórdicos. Onde o regime é completamente diferente. As luzes dos escritórios apagam-se às 17h. Não é permitido trabalhar mais e nem aconselhado atender o telefone ou ver e-mails em casa. A partir dessa hora o tempo do trabalhador transforma-se em tempo da PESSOA.
Não será que esta pessoa amanhã será um trabalhador mais focado? Nestes países considera-se que o trabalhador é profissional por fazer o seu trabalho no tempo de trabalho (imaginem!) Em Portugal é ao contrário. O melhor é aquele que fica mais tempo, fazendo até com que existam “conflitos” entre os colegas e não só. Esta cultura portuguesa é a causa de desmotivação, tristeza, cansaço extremo e ainda de burnout.
É possível ser feliz no trabalho
A Paula Cordeiro, no seu livro “Vida Instagramável” diz aquilo que a mim me parece ser uma bela descrição do que é, ou deve ser, trabalhar: “Acredito que , mais do que viver para trabalhar, ou do que trabalhar para (sobre)viver, o trabalho faz parte integrante da nossa vida. Terá, portanto, de ser gratificante, de corresponder às nossas expetativas, de nos complementar e fazer crescer como pessoas.”
Há profundas mudanças que as empresas portuguesas precisam fazer. A primeira será entender que os seus profissionais têm vida. Depois era importante que soubessem valorizá-los. Isso ajudaria à sua motivação diária e por consequência à sua realização. Depois há também mudanças que nós próprios precisamos fazer. E é possível sim, ser feliz no trabalho. Sou prova disso. E sou defensora que devemos sempre procurar um lugar onde nos sintamos bem e recompensados por aquilo que valemos DURANTE as horas de trabalho designadas por lei.
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