O pai e o filho da fila do supermercado
Eu estava na fila para pagar do supermercado. Não era fim do mês. Toda a gente tinha poucas compras. Era aquele final de dia em que só passamos para comprar alguma coisa que faz falta para o jantar. As filas são por si só aborrecidas. Para mim que sou impaciente, tiram-me anos de vida. Não são raras as vezes em que dou por mim a bufar. Indelicado. Eu sei.
À minha frente, a senhora do Pingo Doce que comenta as compras das pessoas. Atrás de mim, mas suficientemente perto, para eu poder ouvir a conversa (e entreter-me), estavam um pai e um filho. A criança que não teria mais de oito anos.
O pai que já está velho
O pai, a brincar, responde a algum pedido inusitado do filho ” oh filho, eu já estou velho”. Disse-o num tom mais cansado do que realmente parecia estar para fazer alguma coisa que o filho lhe acabou de pedir. Talvez tivesse vindo do trabalho e antes lhe apetecesse estar no sofá em vez de estar naquela fila. Compreendo. Até mesmo eu que recuso a idade o mais que posso, era capaz de proferir a mesma frase se isso me fizesse teletransportar daquela fila para dentro de minha casa. A criança diz imediatamente “não estás não!”. Não pensou, nem pestanejou. A sua ingenuidade e energia tão típicas da idade fizeram-no disparar aquela resposta tão autêntica.
E eu, já enquanto metia as compras nos sacos, pensei que tal como os pais nunca veem que os seus filhos já estão crescidos, para os filhos os pais nunca envelhecem.
Os pais não têm idade
Para os pais, os filhos são crianças. Para sempre! Podem já ter passado dos trinta anos ou dos quarenta. Há um eterno sentido de responsabilidade. Os pais são cuidadores desde o momento que geram a vida até (idealmente) à sua morte. À dos pais, nunca à dos filhos. Não deixam de se preocupar. Não dormem (com os dois olhos fechados) nunca mais. Porque há um ser dependente que veio de dentro deles e que são parte de si para todo o sempre.
Os filhos nunca olham para os seus pais como velhos. Para os filhos, os pais não têm idade. Não é concebível pensar na ausência deles porque eles sempre estiveram lá quando olharam para trás. Ao contrário dos pais, os filhos não conhecem o mundo sem eles.
Mas em ambos os casos a questão que se coloca é a mesma. A dificuldade de aceitar a passagem do tempo, o envelhecimento e em última análise a morte. Revejo-me na conversa que ouvi à socapa. Os pais já viveram sem os filhos em alguma altura da vida. Viram-nos chegar. Os filhos nunca conheceram a vida sem os pais. Mas veem-nos partir. São vidas ao contrário.
Mariana Leal
Durante anos vi os meus pais como “eternos”, adquiridos. Agora que entro nos 30 e eles avançam nos 60, penso cada vez mais no inevitável dia em que vão deixar de estar cá. E choro, não estou pronta para isso. Não sei se alguém está. Mas começa a apertar o coração, mesmo sabendo que é o ciclo da vida
Andreia Moita
Este texto é exatamente sobre isso. Obrigada pelo teu comentário 🙂